quarta-feira, 2 de maio de 2012

A falta de senso humano da Comissão Episcopal contra o Código Florestal

Nossos pastores devem receber o nosso respeito por serem simplesmente nossos pastores, correto? Ora, se estamos a falar de um respeito humano, devido a todo o ser humano, certamente sim. Já se estamos a falar de um respeito e adesão total às suas opiniões, o próprio Concílio Vaticano II na Constituição Apostólica Lumen gentium afirma que, individualmente, ou seja, fora da comunhão com o Sucessor de Pedro (o Papa), estes não detém de infalibilidade nas suas opiniões. Sendo assim, quando assim o fazem, lhes devemos respeito, mas não concordância. Verbis:

Embora os Bispos, individualmente, não gozem da prerrogativa da infalibilidade, anunciam, porém, infalivelmente a doutrina de Cristo sempre que, embora dispersos pelo mundo mas unidos entre si e com o sucessor de Pedro, ensinam autenticamente matéria de fé ou costumes concordando em que uma doutrina deve ser tida por definida (76)

Não é a primeira vez que a CNBB se mete nesse assunto de interesse globalista que é o ativismo ecológico. Isso já havia ocorrido na Campanha da Fraternidade de 2011, quando utilizaram-se do tema "A criação geme em dores de parto" (Rn 8:22) para promover uma campanha desse cunho, da qual não havia qualquer finalidade humana, muito menos espiritual.
Poderia ser implicância minha, na qual poderia eu ser taxado como um ortodoxo lunático, não fosse uma opinião de mero bom senso fundada na própria palavra do Papa Bento XVI em relação à Campanha:

O homem só será capaz de respeitar as criaturas na medida em que tiver no seu espírito um sentido pleno da vida; caso contrário, será levado a desprezar-se a si mesmo e àquilo que o circunda, a não ter respeito pelo ambiente em que vive, pela criação. Por isso, a primeira ecologia a ser defendida é a “ecologia humana”[grifo nosso] (cf. Bento XVI, Encíclica Caritas in veritate, 51). Ou seja, sem uma clara defesa da vida humana, desde sua concepção até a morte natural; sem uma defesa da família baseada no matrimônio entre um homem e uma mulher; sem uma verdadeira defesa daqueles que são excluídos e marginalizados pela sociedade, sem esquecer, neste contexto, daqueles que perderam tudo, vítimas de desastres naturais, nunca se poderá falar de uma autêntica defesa do meio-ambiente[grifo nosso].

Ou seja, o Santo Padre em pessoa afirmou para a CNBB que sua campanha estava errada! E, sim, havia uma razão muito simples para pedir que esquecessem da ecologia verde e se focassem na ecologia humana. Lembrem-se que, em 2011, o julgamento do Supremo Tribunal Federal em relação ao aborto de anencéfalos já estava na iminência de acontecer e as únicas ações da CNBB em relação a isso foram tardias e próximas ao julgamento somente em 2012! Essas ações, como instituição episcopal, foram uma divulgação de uma nota e uma vigília em frente ao STF. 
Não houveram quaisquer ações em 2011 por parte da instituição CNBB - se não por parte de seus bispos individualmente - que lembrassem a preservação da vida, principalmente nos casos mais delicados de anencefalia, como pediu o Papa Bento XVI. 
Neste total ambiente de alienação, principalmente entre os católicos, o julgamento ocorreu e a eugenia venceu. Nem sequer soube-se de qualquer declaração da CNBB após o evento, em relação a haver plena excomunhão dos ministros que se manifestaram à favor da barbárie, como é de praxe ocorrer ao redor do mundo.
Em consciência da infalibilidade papal em relação a essa importância à vida e da desobediência que de fato ocorreu, voltemos a falar da Campanha da Fraternidade de 2011. 
O site Deus lo Vult! publicou uma contagem das palavras contidas naquele texto-base da campanha para provar que de espiritual aquela campanha nada possuía. O resultado quando colocamos radicais referentes ao materialismo versus os relacionados ao espiritual, acima da contagem da finalidade quaresmal da oração (com quatro ocorrências), é o seguinte:

Espiritual:
-“Deus”: 155 ocorrências.
-“Eucaristia”: 16 ocorrências.
-“Jesus”: 14 ocorrências.
-“Pecado” (e derivados): 11 ocorrências.
-“Papa”: 8 ocorrências.
-“Santificação” (e derivados): 7 ocorrências.
-“Católica” (e derivados): 6 ocorrências.
-“Bíblia”: 6 ocorrências [mais duas no título de duas citações, à página 32].
-“Salvação” (e derivados): 5 ocorrências.
-“Nosso Senhor”: 5 ocorrências.
-“Oração”: 4 ocorrências [sendo três nas primeiras páginas e uma referência à oração de São Francisco em louvor pelas criaturas].


Material:
-“Produção” (e derivados): 98 ocorrências.
-“Desenvolvimento” (e derivados): 74 ocorrências.
-“Energia”: 69 ocorrências.
-“Terra”: 69 ocorrências.
-“Água”: 59 ocorrências.
-“Ambiente”: 59 ocorrências.
-“Efeito estufa”: 58 ocorrências.
-“Aquecimento”: 51 ocorrências ["aquecimento global", 42].
-“Consumo” (e derivados): 50 ocorrências.
-“Ecologia” (e derivados): 37 ocorrências.
-“Carbono” (e derivados): 36 ocorrências.
-“Governo” (e derivados): 32 ocorrências.
-“Economia” (e derivados): 32 ocorrências.
-“Alimento” (e derivados): 29 ocorrências.
-“Pobre” (e derivados): 20 ocorrências.
-“Temperatura”: 23 ocorrências.
-“Lucro”: 15 ocorrências.
-“Petróleo”: 10 ocorrências.
-“Exploração” (e derivados): 10 ocorrências.

Assim, fica evidente o cunho extremamente político e não espiritual da Campanha da Fraternidade de 2011. Porém, ela ainda fica pior quando vemos o site Fratres in Unum publicar a letra do hino da CF de 2011: um verdadeiro culto pagão à "mãe natureza", ao comunismo e à chamada Nova Era.

1. Olha, meu povo, este planeta terra:
Das criaturas todas, a mais linda!
Eu a plasmei com todo amor materno[grifo do site Frates in unum],
Pra ser um berço de aconchego e vida. (Gn 1)
Nossa mãe terra[grifo do site Frates in unum], Senhor,
Geme de dor noite e dia.
Será de parto essa dor?
Ou simplesmente agonia?!
Vai depender só de nós!
Vai depender só de nós!
2. A terra é mãe, é criatura viva[grifo do site Frates in unum];
Também respira, se alimenta e sofre.
É de respeito que ela mais precisa!
Sem teu cuidado ela agoniza e morre.
3. Vê, nesta terra, os teus irmãos. São tantos…
Que a fome mata e a miséria humilha.
Eu sonho ver um mundo mais humano,
Sem tanto lucro e muito mais partilha![grifo do site Frates in unum]
4. Olha as florestas: pulmão verde e forte!
Sente esse ar que te entreguei tão puro…
Agora, gases disseminam morte;
O aquecimento queima o teu futuro[grifo do site Frates in unum].
5. Contempla os rios que agonizam tristes.
Não te incomoda poluir assim?!
Vê: tanta espécie já não mais existe!
Por mais cuidado implora esse jardim!
6. A humanidade anseia nova terra. (2Pd 3,13)
De dores geme toda a criação. (Rm 8,22)[grifo do site Frates in unum]
Transforma em Páscoa as dores dessa espera,
Quero essa terra em plena gestação!



E a coisa, meus caros, vai piorar ainda mais! 
O texto-base da Campanha da Fraternidade de 2011 foi retirado do site da CNBB, se em comparação com o da CF deste ano, muito mais espiritual e em comunhão com a Igreja Católica. Não obstante, na internet a semente ecológica do texto-base se espalhou em sites ativistas e de esquerda. 
Existe uma razão grave para ter sido retirado do site da CNBB: uma falsa citação do Santo Padre. Não, você não leu errado. Vejam o conteúdo do item 149 do referido texto:

149. O Papa Bento XVI tem manifestado grande preocupação pelas questões ambientais, tanto que em seu pronunciamento na abertura da Conferência de Aparecida, disse: “com muita frequência se subordina a preservação da natureza ao desenvolvimento econômico, com danos à biodiversidade, com o esgotamento das reservas de água e de outros recursos naturais, com a contaminação do ar e a mudança climática. As possibilidades e eventuais problemas da produção de agrocombustíveis devem ser estudadas, de tal maneira que prevaleça o valor da pessoa humana e de suas necessidades de sobrevivência. A América Latina possui os aquíferos mais abundantes do planeta, junto com grandes extensões de território selvagem, que são os pulmões da humanidade. Assim, se dão gratuitamente ao mundo serviços ambientais que são reconhecidos economicamente. O estilo de vida dos paises desenvolvidos seria o principal causador do aquecimento global”(78). Assim, temos afirmações claras sobre o tema nas conclusões de Aparecida que entende as questões ecológicas como um dos novos aerópagos da evangelização(79). Este é um exemplo de como Bento XVI tem inserido as temáticas relativas ao meio ambiente nas discussões e documentos mais relevantes da Igreja.

Lamentável é que a fala do Papa Bento XVI - remetida pela citação de número 78 - não se destina ao seu pronunciamento na Conferência de Aparecida, mas ao livro "Ecologia nos documentos da Igreja Católica", do Frei Ludovico Garmus! Note também, caro leitor, que o Pontífice Romano jamais citou qualquer referência ao menos parecida a esta fala no seu discurso em Aparecida. Sendo assim, não precisamos sequer estender nossas provas para afirmar: quando a CNBB, a instituição episcopal que escreveu este texto, trata de ecologia sem pensar na pessoa humana, ela está sim fazendo isso sem qualquer comunhão com o Papa Bento XVI.
No dia 1º de dezembro de 2011, a mesa da CNBB retornou a forçar novamente o assunto. Seu alvo, desta vez, não era somente o aquecimento global, mas o Código Florestal aprovado democraticamente pelos representantes do povo, contrários à vontade de "Vossa Majestade", a "presidenta" abortista admitida, Dilma Rousseff. Assim, emitiram uma nota, como é de costume, alertando para os "perigos" da nova lei, aprovada democraticamente no dia 25 de abril de 2012. Da redação da referida nota podemos destacar o seguinte:

Diferentemente do que vem sendo divulgado, este projeto não representa equilíbrio entre conservação e produção, mas uma clara opção por um modelo de desenvolvimento que desrespeita limites da ação humana.

Talvez a referida instituição não saiba, mas as mudanças do Código Florestal são mínimas para uma verdadeira valorização da vida humana, através do trabalho, da propriedade e do desenvolvimento, em face a uma preservação imotivada, caracterizada pelo culto vazio a tudo que é verde em preferência ao que é feito à imagem e semelhança de Deus. 
A nova legislação prevê, como principal meta, a retirada do monopólio controlador do CONAMA - o órgão deliberativo ambiental da União - que atualmente detém de todo o poder para dar licenças para obras que demandem o desenvolvimento de certas regiões, a fim de dar liberdade para que os estados legislem sobre o tema de acordo com a necessidade de preservação e de desenvolvimento que possuírem, o que respeita, sim, a gregos e troianos.
Porém, o que surpreende não é somente a CNBB classificar o agronegócio que alimenta milhões de brasileiros como "grupos específicos contrários ao bem comum", mas a crueldade em que afirmam a questão dos morros que, segundo eles, "perderão sua proteção, sujeitados a novas ocupações agropecuárias que já se mostraram equivocadas". Ora, a grande maioria que plantam nestes morros são agricultores familiares de baixa renda, que somente aquele imóvel possuem e não perderão sua terra em razão do novo Código Florestal, mas justamente pela proibição do gozo de suas propriedades, o que será mantido se o Código não for aprovado. Como pode ser "o bem comum" a limitação do trabalho humano para sobrevivência, em face a uma preservação irracional de um espaço de total inércia ambiental? Não somente reitero a crueldade dessa afirmação, como afirmo a sua total falta de caráter humano.
O texto ainda comete um "non sequitur" ao afirmar "O cuidado com a natureza significa o cuidado com o ser humano. É a atenção e o respeito com tudo aquilo que Deus fez e viu que era muito bom (cf. Gn 1,30)". A afirmação é relativa à própria redação bíblica do Genesis:

Deus criou o homem à sua imagem; criou-o à imagem de Deus, criou o homem e a mulher. (27) 
Deus os abençoou: "Frutificai, disse ele, e multiplicai-vos, enchei a terra e submetei-a. Dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus e sobre todos os animais que se arrastam sobre a terra[grifo nosso]." (28) 
Deus disse: "Eis que eu vos dou toda a erva que dá semente sobre a terra, e todas as árvores frutíferas que contêm em si mesmas a sua semente, para que vos sirvam de alimento[grifo nosso]. (29) 
E a todos os animais da terra, a todas as aves dos céus, a tudo o que se arrasta sobre a terra, e em que haja sopro de vida, eu dou toda erva verde por alimento[grifo nosso]." E assim se fez. (30) 
Deus contemplou toda a sua obra, e viu que tudo era muito bom[grifo nosso]. Sobreveio a tarde e depois a manhã: foi o sexto dia. (31)

Ou seja, Deus dá a submissão e a dominação da terra, dos animais, de toda vegetação para que ao homem não falte alimento, e nossa Conferência Episcopal, à qual devemos respeito e confiança plena como pastores, afirmam que o que Deus "viu que tudo era muito bom", não era o que Deus de fato viu, mas o que os humanos e os globalistas vêem?
Até quando nossos pastores unidos em conferência, aqueles que devem nos mostrar a porta, continuarão a proibir suas ovelhas de se alimentarem do próprio pasto, fornecido pelo próprio Senhor Deus, o dono do celeiro?
Senhores bispos, com todo o respeito e consideração que tenho pelos senhores, é com pesar que tenho de escrever publicamente artigos como este para que ao menos se inicie ao menos um debate com os fiéis, a fim de promovermos a vontade verdadeira de Deus que, certamente, não será resultado de um unilateralismo ideológico, mas uma caridade profunda ao deliberarmos com todos os lados, em especial o que tenta conservar os valores ocidentais que foram, ao longo dos anos, sustentados e alicerçados pela Igreja Católica e reforçaram a moral judaico-cristã no mundo inteiro.

sexta-feira, 27 de abril de 2012

Os limites da relação Igreja e Estado e o papel do leigo na política


"Dai a Deus o que é de Deus, e a César o que é de César"
Cristo proferiu essas palavras ao ser interpelado por uma pessoa que talvez tivesse a esperança de que, para o Filho de Deus, não fosse correto pagar impostos. E seu desejo acabou sendo frustrado. Nosso Senhor não somente afirmou nessas palavras que é correto "dar a César o que é de César", como "César e Deus não podem ser confundidos". Logo, nos causa o dilema: qual é o limite para essa relação política entre Igreja e Estado?

Para início de conversa, o Estado é hoje reconhecido pelo Concílio Vaticano II como, se exercitado pela política, o potencial maior promotor do bem comum dentre todas as instituições da terra, incluindo a própria Igreja. Isso porque o Estado não foi feito apenas para o povo de Deus, mas para todas as pessoas que estão inseridas na mesma sociedade que é também ocupada pelo povo de Deus. A "Gaudium et Spes" deixa isso muito claro na relação que o Estado deve possuir com os ateus, e mesmo assim alguns pertencentes a este grupo insistem em culpar a Igreja das insatisfações de suas vidas vazias, o que tampouco caberia entrar no mérito.

O Estado foi um ente inesperado pela Igreja Católica. Surgiu como forma de colocar reis em patamares superiores em relação à própria Igreja - na Idade Moderna -, e evoluiu no sentido de afastar qualquer valor moral que essa pregasse - no período liberal. E de fato, a retaliação ao eclesial resultou no aperfeiçoamento do Estado não por parte dos liberais franceses, revoltos entre si e traumatizados pela cisma causada, mas pelos liberais ingleses, mesmo que ligados ao protestantismo pregaram a valorização histórica e a moral cristã (mesmo que na forma do puritanismo exacerbado), o que tirou o Estado do ateísmo, aceitando a ética cristã, porém de maneira laica, em forma de princípios.

Foi assim que a Igreja aproveitou-se de sua universalidade, enquanto protestantes e islamicos tornavam seus estados identificados com a sua crença (no ocidente na Grécia, Rússia, Estados Unidos e Inglaterra), para promover a sua doutrina social e preencher as lacunas que não seriam preenchidas pelo empirismo (para não taxar de deísmo) liberal inglês. É por essa razão que não somente a instituição eclesial não quer qualquer relação com a política, e ao mesmo tempo mantém relações diplomáticas com países e com orgãos internacionais, em prol da manutenção da paz mundial e da garantia da dignidade de seus fiéis.

Muitos erros em relação à política e a Igreja foram cometidos neste caminho, muitos deles já admitidos com direito ao perdão expresso do Santo Padre, como no caso das cruzadas. Porém, é da universalidade cristã que hoje a Igreja prega que devem-se sair os apostolados cristãos para a política. E como não pode ser do clero, tem de ser dos leigos.

No século XX, passada a guerra, tivemos excelentes exemplos dessa universalidade, na pessoa dos leigos. Leigos católicos, como Jacques Maritain, deixaram a marca da Doutrina Social da Igreja na Declaração Universal dos Direitos Humanos, o documento que criou a ONU. Konrad Adenauer, o católico da Remânia que ousava pregar um novo Estado Federal da Alemanha em pleno reich nazista, foi o primeiro chanceler alemão após a Segunda Guerra Mundial, e em meio a  uma Alemanha devastada reestabeleceu uma federação solidarista com a Lei Fundamental de Bonn. Igualmente Alcides De Gasperi, declarado Servo de Deus, na reconstrução da Itália, que mesmo com o fenômeno da transgressão cultural social construiu instituições fortes o suficiente para o bem comum ser executado socialmente e moralmente, a ponto de dar ao cristianismo um berço onde sua Igreja poderia deitar por mais um século em paz.

São poucos nomes é verdade. O poder que a política representa acaba por corromper os objetivos puros de nossos irmãos que não acreditam serem possíveis efetuarem missões com a mesma galhardia de Adenauer ou De Gasperi. Porém, esses devem ter a consciência de que não é somente a Igreja que os necessita, mas são também os seus próximos, os quais Cristo pediu que fossem amados. E existe ato de amor maior do que promover o bem comum a estes através do maior promotor deste bem? Não enquanto existir a figura do Estado e este tornar isso possível.

Publicado na Revista In Guardia nº 4/2012

Por que a política?


Publicado originalmente no dia 12/02/2011.

Política é a mais nobre das artes. É a arte de fazer o bem comum. Influencia a mim, você, sua família, todos nós. É somente através da política que é possível fazer o bem comum, visto que a sociedade política, apesar de ampla, possui em seu interior um ente perfeito chamado Estado. Ele é o verdadeiro promotor e motor do bem comum, sem ele nada é possível. 
Reafirmo sua perfeição porque possui todas as condições de satisfazer a nossa felicidade de forma subsidiária, seja prestando suas funções de promover saúde, bem-estar, justiça, educação, etc., ou seja promovendo, através de boas instituições que o formam, os bons valores que formam a moral e a consciência da pessoa.
Para uma pessoa, dizer que não gosta de política é a mais egoísta das falas, pois a ela é imbuída a função de "ser cidadão", uma função que requer que se ame e se lute pelo bem comum, mesmo que isso requeira à pessoa levantar-se da poltrona, ignorando a viciante televisão e todas as suas comodidades. 
É, muitas vezes, porque a pessoa não "gosta" de ser cidadã que elegemos pessoas de tão baixo nível para o Congresso Nacional, quando o voto, este sim, deveria valer ouro, e suas mobilizações políticas, que normalmente não acontecem, no mínimo prata.
Você poderia me responder portanto: "mas eu já tenho problemas demais para resolver". Sim! E você tem mais um! Você não sabia, nasceu sem saber que iria ter mais um, mas infelizmente é assim que funciona a democracia!
Por isso escrevo, por isso me dôo de alguma forma a este blog. Após frustradas experiências políticas, se, a partir deste blog, uma pessoa me disser que começou a se interessar pela política e pelo nosso bem comum, já me sinto satisfeito. Esta é a minha missão, este é o meu trabalho em face de Deus: fazer e descobrir vocações políticas para que elas sejam trabalhadas ao máximo e sejam verdadeiros instrumentos de promoção do bem comum.
É o meu bom combate e conto com você para se juntar a mim, sempre que possível.

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Reforma política: chegou a hora?

Tem tomado grande espaço nos noticiários os inúmeros casos de corrupção envolvendo pessoas do partido do atual governo e de seus aliados. Ministérios afundados em corrupção, licitações feitas às escuras, ministros e governantes tomando as dores dos acusados de desvios, enfim, o caos em meio à sociedade política, na qual a totalidade da população brasileira depende direta ou indiretamente.
Em meio a tal situação, a CNBB, na pessoa de seu presidente Dom Raymundo Damasceno, iniciou uma nova campanha para discutir a reforma política e uma melhor alternativa institucional para o Brasil. Mais do que apenas um discurso qualquer pugnando pela ética, foi um verdadeiro apelo pela mudança das estruturas falhas do Estado, no sentido de que se estamos hoje contando com pessoas com fins corporativos ou individuais em meio à sociedade política é porque de alguma maneira a forma institucional permite que essas pessoas cheguem até lá e possam se manter. Mais do que uma mera modificação na lei eleitoral, foi demonstrada a necessidade de uma mudança profunda, de forma com que este problema institucional seja completamente eliminado e não necessite de novas mudanças num futuro tão próximo.
Ocorre que a forma de Estado brasileira tem desrespeitado no decorrer dos tempos o chamado princípio de subsidiariedade, que ensina que se um ente é incapaz de fazer uma determinada função básica à sua existência, deve se dirigir ao ente superior a ele, que deve negar essa subsídio quando se mostrar possível a execução dessa função pelo ente inferior. Assim, desde a formação política da Velha República, o Brasil tem invertido esses papéis em relação ao princípio de subsidiariedade, ora delegando uma autonomia muito precoce aos Estados recém federados e ignorando os municípios - como ocorreu em 1889 -, ora eliminando totalmente essa autonomia com a constituição do Estado Novo de Getúlio Vargas, que centralizou o poder e impediu a auto-aplicação do princípio. As cicatrizes desses erros institucionais permanecem até hoje e são percebidas desde a centralização do sistema tributário - onde 80% dos tributos ficam nas mãos da União, bem longe dos municípios e das pessoas - até a concentração exacerbada do poder político na pessoa do Presidente da República, que sozinho detém a chefia do Estado, do governo e da administração, o que poderíamos classificar como um verdadeiro absolutismo moderno, com roupas de democracia e legitimado pelo sufrágio universal.
Agora que os problemas do Brasil estão longe de ser os econômicos, devemos refletir sobre o sistema presidencialista e como ele tem se tornado insustentável para a sociedade organizada na forma federativa. Neste sentido, até mesmo a superpotência americana tem demonstrado a fragilidade e a falta de eficácia deste sistema, uma vez demonstradas as dificuldades do democrata Barack Obama em aprovar o novo teto da dívida americana em uma câmara com maioria parlamentar republicana. No Brasil, nessas situações, o presidente "compraria" a oposição com a moeda da administração pública, mas em países parlamentaristas o chefe de governo elegantemente renunciaria e seriam convocadas novas eleições, que seriam vencidas pela maioria eleita pelo povo.
E então vos pergunto: há sentido em haver uma votação direta para Presidente da República? Respondo: sim, desde que este presidente seja um mero chefe de Estado, guardião da soberania nacional, e não detenha funções de governo e nem de administração. 
A verdade é que existe um caminho muito difícil de ser percorrido sem a imposição popular, pois este atentado partidário à administração pública pode jamais cessar, visto que rende muito dinheiro a todos os partidos políticos e a alguns candidatos eleitos, dependentes do atual sistema eleitoral. Mas como nos ensina o Catecismo: o bem comum, que se origina do Estado, além de ser nosso e de todos, é a razão de ser da autoridade política (a. 1910). Havendo outra razão de ser, é uma deturpação de seu papel, um desvio moral que tira a razão da existência do ente político maior. Sendo assim, é nosso dever nos preocuparmos com este bem comum através da política, formando uma nação verdadeira que seja dependente de seu povo, e nunca o contrário, como atualmente ocorre.

Publicado na Revista In Guardia nº 2/2011